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Manejos Clínicos: Norteamentos e Balizas

Artigo baseado no percurso Psicanálise e Psicoses: Manejo e Possibilidades de uma Clínica Nodal já disponível na plataforma ESPEcast.


Abordar elementos norteadores para o estabelecimento de manejos clínicos das psicoses a partir da obra de Freud e Lacan, assim como enfatizar as implicações que a pluralização dos Nomes-do-Pai comporta para o tratamento possível das psicoses para então abordar o que vem a ser a demarcação de uma clínica nodal neste território.

Esta é a proposta trazida pelo psicanalista Dr. Alexandre Simões no percurso “Psicanálise e Psicoses: Manejos e Possibilidades de uma Clínica Nodal”, disponível para assinantes da plataforma ESPECast e dividido em 4 encontros.

Neste artigo, apresentamos alguns recortes dos apontamentos iniciais feitos pelo Dr. Alexandre neste percurso a respeito da clínica psicanalítica, no que tange a questão de direcionamentos e manejos clínicos. 

Boa leitura.


 


Norteamento e Balizas

“Quem trabalha junto de mim nos seminários sabe o tanto que eu enfatizo essa questão do norteamento, das balizas, para voltar a um tema muito, muito trabalhado. Como que isto, a meu ver, é fundamental para a prática analítica, uma prática que tenha um certo norteamento - que tenha balizas -  que tenha pontos de referência quanto ao seu caminhar, quanto à direção do trabalho analítico.” – Alexandre Simões


Esta questão – a das balizas – é derivada da formulação de Jacques Lacan no título de seu artigo, presente nos Escritos, A Direção da Cura e os Princípios de Seu Poder, onde ele desenvolve, no final dos anos 50, a ideia da direção do tratamento, ou seja, da direção de uma análise. O viés para onde o trabalho de uma análise aponta. 


Não se trata, de maneira nenhuma, por meio dessa ideia, de se pensar uma prática diretiva quanto ao sentido de direcionar a vida da pessoa, suas escolhas, os rumos que cada um tem e há de assumir em sua vida. De forma alguma. O que se põe em jogo é precisamente a ideia de que a prática analítica – uma vez que se tem clareza quanto aos seus fundamentos – apresenta elementos norteadores.


A questão dos fundamentos, portanto, se coloca como extremamente importante também neste contexto. Nas palavras do Dr. Alexandre Simões: “Lacan abre o Seminário 11 chamando, convocando a sua audiência para esta sensibilidade, para este exame constante quanto aos fundamentos, quanto às bases, ao alicerce. Ou seja, uma prática analítica está assentada, está alicerçada pelo quê? Ela está assentada sobre o quê?”


As preciosas ideias então de direção e de fundamentos se relacionam e se complementam ao considerarmos uma prática analítica que se oriente em função de uma clareza quanto aos seus fundamentos e de um apontamento quanto às suas consequencias.



O analista e seus bisturis

Em dois momentos específicos de sua obra – na última das Cinco Lições de Psicanálise e na Conferência 28 das Conferências Introdutórias à Psicanálise – Freud estabelece uma homologia entre o ato do analista e o ato do cirurgião. 


“Eu sempre ressalto isso, para que a gente possa extrair - não só ter a informação, não se trata só disso -  mas para que nós possamos extrair consequências disso. Então o analista ele opera. O analista ele faz cortes, suturas. Ele demarca uma zona de intervenção. Ele retira algo. Ele abre caminho para que alguma coisa possa ser ali suturada. Então isso tudo que está em jogo na noção da utilização de um bisturi -  e certamente quando falamos em operação não estamos falando da operação do cirurgiar, não estamos falando somente em um bisturi, estamos falando em bisturis -  então aí podemos pensar em bisturis da clínica, bisturis da prática.” – nos diz Simões acrescentando salientando que já em Lacan, um ponto importante a ser considerado é a questão do corte da sessão e na sessão. 


“Eu sempre enfatizo ao falar disto, para uma questão de contraponto: temos de pensar no corte da sessão – evidente os holofotes sobre ele. O término de uma sessão, mas, sobretudo o corte na sessão. Então, o corte interpretativo, o próprio manejo da transferência que faz corte em uma certa direção imaginária, isso tudo é muito importante. Seja por esta evidência maior -  do corte da sessão -  ou por algo mais discreto, mas de largo alcance – o corte na sessão – certamente Lacan está aqui advertido quanto a essa homologia que Freud estabelece entre o analista o ato do cirurgiar.”


Freud nos diz que o ato do analista é um ato que comporta um “cirurgiar”, o que é uma ideia muito prática, de manejo, de intervenção, de “colocar a mão na massa.”. Essa ideia , segundo Simões nos conta na introdução desse percurso, vai ser articular com o momento em que Lacan vai dizer que para que haja análise, há de haver um analista. O analista tem que estar ali, implicado.


“O analista é uma marca. O analista é uma presença que tem relação com esta dimensão do manejo.” – nos diz Simões concluindo esta importante homologia entre o ato do analista e o ato do cirurgiar. -  “O analista, ele opera. Então, o analista está ali a causar e a participar de uma operação. Então, isso é muito importante, a meu ver, para, de fato, considerarmos o que se constroi na clínica. A dimensão da poieses. Poieses, fazer, construir, poetizar, juntar elementos que estão ali à nossa disposição para que um efeito de uma outra ordem se coloque. Não é isso que é o poetizar, a poieses? ”


Sobre a psicose – ou as psicoses – Simões pontua que ela nos convoca a estarmos atentos quanto os manejos clínicos, no plural, e nos convoca a estarmos sempre atentos a essa dimensão de poiésis citada, a dimensão da construção, da aposta quanto à construção na prática analítica. Neste percurso, não se aborda – apesar deste ser o tema central – as psicoses, mas se aborda a prática analítica como um todo. 


“Lidar com as psicoses comporta uma especificidade bem interessante. Lidar com as psicoses comporta consequências que vão além do tratamento das psicoses. Isto amplia, abre horizontes.” – Alexandre Simões. 



As psicoses são muito diversificadas

As psicoses são muito, extremamente diversificadas. Tem-se que tomar cuidado quanto a uma tentação de se estabelecer um grande – ou grandes – modelos para o que viria a ser psicose. 


É de longo alcance para a nossa sensibilidade clínica compreendermos que as psicoses podem ser discretas, sutis. Perceber que psicose não é sinônimo de enlouquecimento. O enlouquecimento se coloca na psicose, no surto, entretanto elas se conjugam também com formas diversas de estabilização, em formas diversas do sujeito se sustentar ali onde, ainda que precariamente, coloca-se sempre a possibilidade de um desabamento – mas ele se sustenta.


Temos então pluralidades. Diversidades. É preciso escapar da ideia de uma topologia estrita, fechada.



 

Quer saber mais?

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Transcrição e adaptação:

Gustavo Espeschit é psicanalista, professor e escritor. Pós-graduado em Fundamentos da Psicanálise: Teoria e Clínica pelo Instituto ESPE/UniFil e Pós-graduado em Clínica Psicanalítica Lacaniana pela mesma instituição. Formado em Letras Inglês/Português com pós-graduação em Filosofia e Metodologia do Ensino de Línguas.


Autoras do episódio:

Alexandre Simões: psicanalista, formado em Psicologia pela Universidade Federal de Minas Gerais, com Mestrado e Doutorado na Área da Psicanálise por esta mesma Universidade. Autor de diversos artigos e livros. Realiza atendimentos e supervisões presenciais e on-line, além de conferências, palestras, grupos de estudo e cartéis. Estabelece diálogos interdisciplinares e se concentra em investigações sobre a Clínica Psicanalítica na Contemporaneidade.





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